O Sensacionalismo e a Educação na história do Jornalismo

Por Alessandro Lo-Bianco 

 O século XIX europeu mudou radicalmente as condições em que se exercia o jornalismo. Com a Revolução Industrial, o público leitor ampliou-se rapidamente. A crise do modo de produção feudal – destruído, entre outros fatores, pela concorrência dos produtos vindo de regiões recém-colonizadas da América, África e Ásia – deslocou importantes contingentes de população para as cidades.  O surgimento de instalações fabris concentrou, em condições sociais particularmente difíceis, os operários – cujos antepassados trabalhavam em suas próprias aldeais (na origem, a palavra fábrica quer dizer “a casa do operário”). A organização do trabalho e a expansão do comércio exigia um grande numero de administradores, capatazes e técnicos, necessariamente alfabetizados.

As tiragens dos jornais, por tudo isso, multiplicaram-se por cem ou por mil. Para produzir um número tão elevado de exemplares, a mecanização – chave da Revolução Industrial – chegou a indústria gráfica. Surgiram logo no início do século, então, as impressoras rotativas de grande capacidade.

Foi necessário mudar progressivamente os estilos das matérias que os jornais publicavam. A retórica do jornalismo publicitário era impenetrável para os novos leitores, até então herdeiros de uma tradição de cultura popular muito mais objetiva. Além disso, a guerra de opiniões perdia o interesse porque não havia, como antes, aristocracia poderosa para se opor ao pensamento burguês. Além disso, a organização dos operários para ação política e contínua sempre esbarrou em grandes obstáculos. Ou em repressão policial, ou em recessão econômica.

O público – pessoas comuns – não os segmentos engajados, é pragmático: para entusiasmar-se por uma ideia  não lhe basta que esta pareça verdadeira. Era preciso que fosse exequível. Assim, o discurso revolucionário costuma funcionar apenas, em termos de mobilização ampla, quando apoiado em uma estrutura politica suficientemente poderosa, ou quando responde à uma situação de real desespero.

Com a mecanização, o custo de produção dos jornais havia aumentado. Eles já não eram financiados pelos seus leitores como antes. O mercado publicitário nascia e, com ele, a integração da imprensa com os interesses gerais da economia. Precisavam de anúncios e estes dependiam dos de leitores. A luta pelo mercado desataria nas décadas seguintes forte concorrência entre gêneros distintos que os jornais passaram a abrigar. As novelas ou os folhetins – textos literários extensos que eram publicados em capítulos nos rodapés das páginas; os desenhos alegóricos ou satíricos, que dariam origem ao cartum, a charge e as historias em quadrinhos; as novidades, com ênfase na vida real ou na realidade imediata, ora em países remotos cujos estranhos costumes e paisagens ofereciam a dose necessária de fantasia. O jornalismo dessa época pode ser considerado de um lado educador e de outro sensacionalista.

A verdade educativa se explica porque a incorporação dos novos contingentes populacionais à sociedade industrial implicava mudanças radicais de comportamento e da compreensão das relações humanas. Em lugar do ciclo anual de atividade, como o plantio e colheita, a rotina diária do trabalho nas fábricas e escritórios. No lugar da servidão instituída – contrato tácito pelo qual o servo espera que o patrão o socorra em momentos difíceis – o regime de salários sujeito a nenhum arbítrio de leis que então sequer existiam. Em lugar da vizinhança conhecida estável e unida por laços de solidariedade, a multidão de estranhos que se solidarizava em espasmos, como numa greve, na torcida um time de futebol ou na explosão de raiva de um quebra-quebra. A vida em sociedade era bem mais dinâmica do que antes e tudo mudava rapidamente. Dai o interesse que passaram a ter nos críticos – de literatura, de teatro, de moda e de costumes. O jornal ensinava às pessoas o que ver, o que ler, como se vestir e como se portar – e mais: exibia, como numa vitrina, os bons e, para escândalo geral, os maus hábitos dos ricos e poderosos.

A vertente sensacionalista se justifica porque, para cumprir a função socializadora e educativa, devia atingir o público e envolvê-los para que realizassem a leitura até o fim e se emocionassem. Foi preciso abordar então temas que o empolgassem. O paradigma para isso era a literatura novelesca: o sentimentalismo para as moças, a aventura para os jovens, o exótico e o incomum para toda gente. A realidade deveria ser tão fascinante como a ficção, e, se não fosse, era preciso fazê-la ser. Caso necessário o paradigma se consumaria: o público não iria se sentir atraído para prestar atenção em nada que pudesse educá-los através da leitura.
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